I'M A CREEP, I'M A WEIRDO... (OU ARQUÉTIPOS DA REJEIÇÃO)
Bem, vários posts perdem-se no tempo devido à fluidez dos pensamentos. Às vezes tento reprocessar determinados encadeamentos de idéias que me ocorreram em determinado momento e, na maioria das vezes, fracasso totalmente. De toda forma, tentarei reproduzir algo que me veio à mente por esses dias quando andava de "Jardim São Paulo (Abdias de Carvalho)". Tudo começou quando eu avistei entrar no ônibus um bebê com "Síndrome de Down". Lembrei-me automaticamente de como os povos indígenas (acho que a maioria) sacrificam os bebês que nascem com alguma deficiência. Recentemente, quando via televisão de relance, o Globo Repórter estava mostrando algumas tribos brasileiras sobreviventes. E numa dessas havia um caso de um menino que, salvo engano, possuía uma deficiência, mas que, sabe-se lá por quais razões, não foi sacrificado.
Ora, que culturas atrasadas hein ? Afinal somos muito mais humanos, não somos ? Ainda bem que cristianizamos a maioria de nossos índios, não ? (suspensão da ironia/polêmica - deixemo-na no ar, dependurada...)
Em seguida fui remetido ao Admirável Mundo Novo de Huxley. Mais especificamente aos intrigantes personagens Bernard Marx (nome extremamente sarcástico no que se refere ao socialismo - assim como todo conteúdo do livro) e John, o Selvagem. São dois personagens com anseios diferentes, mas com a mesma carga de "rejeição social". Marx embora fosse "alfa mais", não tinha a estatura normal para tal (era próxima da de um "beta menos") - fato esse suficiente para toda espécie de gracejos, ridicularizações perante mulheres, colegas... puxando pra música pop, o verdadeiro "cara estranho", "creep", "weirdo"...
a partir daí a corrente assumiu um estatuto mais "pessoal"... reminiscências de minha adolescência anti-social ... acho que, na "vida real" assim como no livro, as pessoas que tendem a ser naturalmente "expelidas" do tecido social acabam por formar uma espécie de "grupinho", onde todos estão ligados pela inadequação à categoria mais "larga" de normalidade ...
É engraçado como esses filmes "high school" norte-americanos possuem uma afeição por esse tema. Sempre existe uma espécie de tentativa de harmonização por parte dos "perdedores, impopulares" com aqueles que são os cruéis "vencedores, populares"... a maioria possui aquele típico "moralismo he-man" de que "não devemos julgar pelas aparências". Assim, há uma reviravolta previsível: os nerds são humilhados ao extremo até conseguirem, através da inteligência, mostrar seu valor aos "incrédulos".
Que o ser humano possui um instinto animal isso pra mim é óbvio. Agora, quanto à pior forma de crueldade existente (a da natureza ou da civilização), minha balança pende mais pro lado de considerar como tal esta última. Não que eu concorde que devamos exterminar, como os índios, qualquer vestígio de "anormalidade física", mas, nossa crueldade de "homem branco" é muito mais rica de matizes e muito mais camuflada do que a do índio. Temos perversões, crueldade para todos os gostos possíveis e imagináveis. Podem olhar nas prateleiras da história, ou até pra dentro de nós mesmos...
Será que o pudor é mesmo uma forma mais inteligente de perversão ?
Mas, olhando o assunto de outra forma - a forma da qual eu realmente tinha a intenção inicial de falar nestas mal escritas... Vocês sacam como a maioria das pessoas que se dedicam à busca do conhecimento geralmente são pessoas que se sentem deslocadas do mundo ordinário ? Como o desconforto nos faz buscar o fundamento de tudo ? Como as crises, os conflitos realmente são importantes para desenvolverem o espírito humano ?
Será que realmente a chave pra "ir mais além" está nas mãos dos desprezados, ignorados, agredidos, humilhados ? Será que o cristianismo está certo, sendo nós que o entendemos errado, julgando-o como incitador ao comodismo de quem se reconhece indigno da plenitude humana na terra ? Será que a plenitude não vem da "farinha do desprezo" ?